domingo, 19 de junho de 2011

Técnicos agrícolas denunciam que não podem emitir receituários

Crea afirma que é preciso assinatura de um engenheiro agrônomo.
Profissionais da categoria têm sido demitidos.

Do Globo Rural
Subindo a Serra da Ibiapaba, no norte do Ceará, fica uma das maiores regiões produtoras de verduras, hortaliças e flores do Nordeste. Nesse lugar de temperaturas amenas, Meire Menezes gerencia uma lavoura de pimentão. Ultimamente, ela notou que algumas plantas ficaram doentes e, por isso, chamou um técnico agrícola para ajudar no diagnóstico. “As estufas começaram a murchar bastante, quase 50% delas já está murcha”, afirma Meire Menezes, gerente.
O técnico agrícola Amauri Barreto inspecionou a plantação e, entre algumas orientações de manejo, recomendou o uso de um agrotóxico. “Vou passar o receituário para ela, mas não posso assinar, é aí que está o problema, fica difícil da gente trabalhar dessa forma”, declara.
No Ceará, os técnicos agrícolas se encontram proibidos de emitir o receituário agronômico por conta de uma decisão do Crea, o Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia, que nega essa atribuição, assim que se entra com o pedido de registro profissional.
Na prática o que está acontecendo no Ceará é que os técnicos agrícolas vão até o campo, fazem o diagnóstico das plantações e repassam para os produtores. Depois eles precisam entrar em contato com um engenheiro agrônomo para emitir o receituário e muitas vezes, eles nem se quer vão ao campo.
Para não gastar com um profissional que não pode assinar o receituário, o produtor de flores Paulo Stéfano demitiu o técnico agrícola que prestava serviços na fazenda e contratou a consultoria de uma empresa de São Paulo, a mais de três mil quilômetros de distância da sua propriedade.
“Essa assessoria se torna mais difícil, já que eles não estão vendo o estado da planta. Nem tudo a gente consegue passar para eles, enquanto o técnico tinha um convívio com a planta no dia-a-dia, ele sabia o que era e o que poderia aplicar”, explica o produtor.
Enivaldo Neves era o técnico agrícola da fazenda de flores, depois de cinco anos de trabalho foi demitido. “Agora eu estou esperando o que vai acontecer com a nossa categoria”, declara.
A proibição atinge os dois mil técnicos agrícolas do estado. A justificativa, segundo o Crea do Ceará, é que as escolas não oferecem qualificação suficiente para esses profissionais no que se refere à emissão de receituário. “A grade curricular de um técnico agrícola gira em torno de 1.500 horas de formação. A de um engenheiro agrônomo ou engenheiro florestal, que são aptos a emitir a receita agronômica, é cerca de três vezes maior, de quatro a cinco mil horas aula”, ressalta José Maria Freire, engenheiro agrônomo - Crea-CE.
Para garantir o direito à sua categoria de dar receita agronômica, a Federação Nacional dos Técnicos Agrícolas, Fenata, tem orientado as associações estaduais a entrar com mandado de segurança na Justiça, com base no decreto 4560, de 2002, que regulamenta o trabalho desses profissionais. O parágrafo 19 do artigo VI diz que dentre as atribuições do técnico agrícola está a responsabilidade pela emissão de receitas de produtos agrotóxicos.
“Parece incrível, depois de quase 30 anos de profissão regulamentada, nós somos obrigados a ingressar em juízo contra os Creas para garantir o direito de exercer a nossa profissão”, afirma Mário Limberger, presidente da FENATA.
É isso que está fazendo a advogada Mayara de Andrade, que representa a Associação dos Técnicos Agrícolas do Ceará. Ela está dando entrada em um mandado de segurança na Justiça para derrubar a proibição.
“Na verdade a lei não fala sobre a questão da grade curricular. Então, não caberia ao Crea, que é um órgão fiscalizador, fazer esse tipo de limitação aos profissionais”, diz a advogada.
Em sete estados, Rio Grande so Sul, Santa Catarina, Paraná, Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Espírito Santo, a Justiça deu ganho de causa em favor dos técnicos agrícolas. No Espírito Santo, a briga durou 13 anos, até que em 2007, a Justiça autorizasse a emissão de receituário por profissionais de nível médio.
“Essa ação foi um referencial. A partir da prescrição do receituário, outras atribuições que estavam em torno dessa atividade foram aceitas. O Crea parou de perseguir o técnico agrícola”, afirma Antonio Carlos Balbino, presidente do Sindicato dos Técnicos Agrícolas do Espírito Santo.
Foi só com essa decisão que José Ramiro, técnico agrícola há 20 anos na região serrana do estado, foi perdoado das 43 multas que recebeu em 2005 por ter emitido receituário agronômico. “Isso me causou muito estresse. Eu precisei viajar várias vezes à Vitória para resolver isso. Desgaste físico, mental e financeiro. Foi muito ruim na época”, conta José Legório Ramiro, técnico agrícola.
Hoje, a situação está bem diferente, tanto que o próprio Crea do Espírito Santo se mostra satisfeito com a nova realidade. “Mais de 90% das propriedades são consideradas pequenas, onde se pratica a agricultura familiar. Portanto há necessidade de mão-de-obra especializada para orientar esses pequenos produtores. Os técnicos agrícolas são parceiros do Crea do Espírito Santo, fazem parte da minha diretoria, fazem parte do nosso plenário e nós queremos cada vez mais valorizar essa categoria tão importante”, declara Luiz Fiorotti, presidente do Crea - ES.
Segundo a Federação Nacional dos Técnicos Agrícolas, os próximos mandados de segurança devem ser solicitados em Pernambuco e na Bahia.

2 comentários:

  1. Se os técnicos agrícolas querem emitir um receituário agronômico, sugiro que façam um curso de Agronomia. Pois não fiquei 5000 mil horas me matando de estudar, passando dificuldades financeiras no decorrer do curso, para que pessoas que estudam somente 1500 horas tenham o mesmo direito. Então acho que é melhor excluir o curso de Agronomia, já que o curso de técnico em Agrícola é suficiente. Acho que que é uma falta de consideração para com aqueles que tiveram que perder cinco anos de sua vida estudando, se qualificando, para a obtenção do título de Engenheiro Agrônomo para poder emitir um receituário agronômico.

    ResponderExcluir
  2. Caro Diógene, as 5 mil horas estudadas não foram apenas para lhe dar atribuição do receituário agronômico. Existem dezenas de outras atividades que você estudou e pode desempenhar.
    O que você tem que entender é que não existe atividade exclusiva para determinada profissão, os Técnicos Agrícolas também estudaram e tem o direito de prescrição de receituário.
    Isto é a mesma questão de topografia, o Eng. Agrimensor estuda 3.600 horas de "topografia", um agrônomo estuda 60 horas e pode assinar levantamentos topográficos.

    ResponderExcluir